sexta-feira, 30 de julho de 2010

Foral da Alfândega, cap. V

Paulo Werneck
Círculo de Joachim Patinir: Naus portuguesas perto de um costão rochoso (c. 1540)
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Nau
CAPITULO V.
Da diligencia que ſe fará nas náos que eſtiverem em franquia.
E Por quanto no porto de Belem ha hum Meirinho, e Eſcrivaõ, e quatro guardas, que andaõ em hum batel na vigia das náos, urcas, e navios que ao dito porto vem: Hei por bem, e mando, que tanto que as ditas náos, e navios ſurgirem no dito lugar da franquia, e forem deſpachados pelos Officiaes da ſaude deſta Cidade, ſegundo a ordem que niſto he dada, logo com muita diligencia vaõ os ditos Officiaes a cada huma das ditas náos urcas, e navios, e ſaibaõ do Capitaõ, ou Meſtre delles para que parte vem fretados, e vindo para eſta Cidade lhe notificaraõ, que ſobpena de cem cruzados ſe façaõ á vela, e ſubaõ para cima, e ancorem defronte do caes d’Alfandega, e iſto na maré logo ſeguinte depois da dita notificaçaõ: porém antes que as ditas náos, urcas, e navios venhaõ do dito porto para cima, entrará em cada hum delles hum dos ditos guardas de Belem, que ſerá pela deſtribuiçaõ que lhe couber, e naõ ſahiraõ dos ditos navios de dia, nem de noite, para effeito de ſenaõ tirar couſa alguma até ancorarem diante do dito caes d’Alfandega, e tanto que chegarem ao dito lugar o viraõ fazer a ſaber ao Provedor, e Officiaes da dita Alfandega, para que provejaõ na guarda, e deſpacho das ditas náos, e navios, no modo que lhe ſerá declarado neſte floral, e chegando de noite, ou a taes horas que naõ poſſaõ fazer a dita diligencia naõ ſahiraõ delles até o outro dia ſeguinte, em que a faraõ como dito he; porém as ditas náos, e navios partiraõ ſempre do dito lugar da franquia a horas, e com maré, que naõ cheguem de noite.

A diligência aqui descrita é a que hoje se denomina de visita aduaneira.
Pelo foral, primeiro as embarcações eram visitadas pelos oficiais de saúde, depois pela fiscalização aduaneira, que entretanto nelas permanecia até que fundeassem no local determinado.
A presença a bordo das embarcações se explicava pela possibilidade de serem jogados volumes às águas, a serem recolhidos nas praias, ou transbordados para barcos menores.
Esse risco hoje é bem reduzido, pois as cargas vem normalmente em cofres-de-carga que necessitam de guindastes para sua movimentação. Ademais qualquer redução na velocidade do navio já seria notada pelos armadores, que certamente não gostariam de financiar tais manobras em prejuízo dos seus lucros, uma vez que o preço altíssimo de um navio exige que seja usado da maneira mais eficiente possível.
Hoje em dia seriam quatro os serviços presentes na visita: a Polícia Federal para controlar os passaportes dos tripulantes (imigração), o Ministério da Saúde para avaliar a saúde da tripulação, o Ministério da Agricultura para verificar as condições sanitárias do navio com respeito à armazenagem de produtos alimentícios; e finalmente a Receita Federal para os procedimentos aduaneiros.
Entretanto, para a Aduana a visita aduaneira, que estava prevista nos artigo 34 e seguintes do Regulamento Aduaneiro de 1985 (Decreto nº 91.030/1985), deixou de existir quando esse regulamento foi revogado (Decreto nº 4.543/2002).
Note-se a expressão "subaõ para cima", significando navegar contra a corrente do rio Tejo, do mar oceano (o Oceano Atlântico) na direção de Lisboa. 
Glossário
Batel: barco a remo que serve para levar e trazer pessoas e mercadorias entre as embarcações e o cais.
Meirinho: equivalente a oficial de Justiça. Em função da separação entre os poderes executivo e judiciário, as aduanas não contam mais com cargos semelhantes a esse.
Oficial da Alfândega: oficial aduaneiro, equivalente, no Brasil contemporâneo, a auditor-fiscal.
Provedor da Alfândega: chefe da alfândega, equivalente, no Brasil contemporâneo, a Inspetor-chefe.
Ponteiros
Sumário
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