segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Sciencia Economica

Paulo Werneck
Visconde de Cairu
Fonte: www.revistadehistoria.com.br


Em 1º de novembro de 1755, quando o Grande Terremoto de Lisboa destruiu a cidade, Dom José I governava um país entregue às chamas da inquisição e fechado ao renascimento científico. A outrora modelar Universidade de Coimbra estava fechada no ensino do direito canônico, banidos Descartes e Newton.

Apresentou-se, "para enterrar os mortos e alimentar os vivos", Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro Marquês de Pombal, que a partir do desastre veio a se tornar ministro todo poderoso, reconstrutor de Lisboa e modernizador de Portugal.

Pombal havia sido embaixador do Reino em Londres, onde conheceu as idéias de Jean-Baptiste Colbert, pensador mercantilista, que havia sido ministro de Luís XIV e é considerado pai da Aduana francesa. Tal pensamento, para um reino atavicamente atrasado, sem indústria, mera sanguessuga de um império colonial problemático, foi uma renovação

Entretanto, morto José I, sua filha Maria Francisca, que se tornou a rainha Dona Maria I, a Louca, o colocou no ostracismo e começou a desfazer a sua obra, restaurando a influência da Igreja e da velha nobreza.

Quando o Príncipe Regente chegou ao Brasil, fugindo dos franceses para manter o trono, uma nova mudança de ventos se fez patente: Dom João, preocupado com a administração científica do Reino, nomeou José da Silva Lisboa professor de Ciência Econômica, para ministrar aulas no Rio de Janeiro, pelo Decreto de 23 de fevereiro de 1808, passado ainda na Bahia:
Sendo absolutamente necessario o estudo da Sciencia Economica na presente conjunctura em que o Brazil offerece a melhor occasião de se pôr em pratica muitos dos seus principios, para que os meus vassallos sendo melhor instruidos nelle, me possam servir com mais vantagem: e por me constar que José da Silva Lisboa, Deputado e Secretario da Mesa da Inspecção da Agricultura e Commercio da Cidade da Bahia, tem dado todas as provas de ser muito habil para o ensino daquella sciencia sem a qual se caminha ás cegas e com passos muito lentos, e ás vezes contrarios nas materias do Governo, lhe faço mercê da propriedade e regencia de uma Cadeira e Aula Publica, que por este mesmo Decreto sou servido crear no Rio de Janeiro, com e ordenado de 400$000 para ir exercitar, conservando os ordenados dos dous logares que até agora tem occupado na Bahia. As Juntas da Fazenda de uma e de outra Capitania o tenham assim entendido e fação executar. Bahia 23 de Fevereiro de 1808. Com a rubrica do Principe Regente Nosso Senhor.
Lisboa, futuro Visconde de Cairu, à semelhança de Pombal, havia estudado Adam Smith, um dos primeiros economistas clássicos. Não cabe aqui traçar-lhe uma biografia. Basta informar que ele havia tomado posse dos cargos na Mesa da Inspeção da Agricultura e Comercio, por determinação do próprio Príncipe Regente em 23 de julho de 1798 e havia publicado, em Lisboa, as obras "Princípios do Direito Mercantil e Leis da Marinha" e "Princípios de Economia Política".

Fonte: www.archive.org

Deve-se notar que Cairú não chegou a exercer o cargo de professor, mas isso não o desabona, pois foi muito ativo na aplicação dos princípios econômicos que defendia, como membro do governo, e na divulgação dos mesmos por meio de obras escritas.

Note-se que, por graça de Dom João, continuou a receber a remuneração pelos cargos que exercia na Bahia, apesar de se mudar para o Rio de Janeiro, numa época em que as comunicações eram demoradas e difíceis, e não se pode dizer que possuísse o dom da ubiquidade de Santo Antonio, quem foi alistado como major de infantaria nas tropas de linha tanto do Rio de Janeiro como da Bahia, percebendo os respectivos soldos (Decretos de 14 de julho de 1810 e 13 de setembro de 1810).

Referências

BRASIL. Colecção das Leis do Brazil de 1808: Cartas de Lei, Alvarás, Decretos e Cartas Régias. p. 2. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891. Disponível em www.camara.gov.br.

BRASIL. Colecção das Leis do Brazil de 1810: Cartas de Lei, Alvarás, Decretos e Cartas Régias. p. 125 e 149. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891. Disponível em www.camara.gov.br.

BRUE, Stanley L. História do Pensamento Econômico. São Paulo: Pioneira, 2005.

FARIA JÚNIOR, Carlos de. O Pensamento Econômico de José da Silva Lisboa, Visconde de Cairú. Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História Econômica do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, para a obtenção do título de Doutor em História. São Paulo: USP, 2008.

SHRADY, Nicholas. O Último Dia do Mundo: Fúria, ruína e razão no grande terremoto de Lisboa de 1755. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.