sexta-feira, 8 de março de 2013

Cruzados da Cadêa

Paulo Werneck

Quando li o Foral da Alfândega de Lisboa, deparei-me, em diversos trechos, com o estabelecimento de penas expressas em tantos "cruzados de cadêa".

De há muito inquiro uns e outros sobre qual a interpretação que se deve dar a essa expressão, mas tais indagações não foram seguidas de respostas críveis, permanecendo assim a expressão envolta em dúvidas.

Finalmente um minúsculo raio de luz se fez presente com o achamento do seguinte texto, inscrito no Repertorio Chronologico:

Alvará de 8 de Julho de 1521, em que ſe acreſcenta a Ordenaçaõ antiga do Senhor Rei D. Manoel, liv. 5. tit. 48. na Rubrica; e ſe determina, que qualquer homem, ou moço, que dentro do Paço, ou varandas delle foſſe achado jogando o Tintinini, pagaſſe da cadêa trezentos reaes para o Meirinho do Paço, e homens da guarda delle, ou para quaeſquer homens de qualquer Meirinho, que o prendeſſem.
Liv. 3. da Supplicaçaõ, fol. 11.
Leaõ na Compilaçaõ das Leis, part. 4. tit. 4. dos jógos defezos, Lei 2. fol. 121.

Com a simples modificação do "de" para "da", fica claro que o meliante é preso e, estando preso, isto é, da cadeia onde está encarcerado, deve pagar os tantos reais especificados nessa norma, cruzados no Foral.

Permanece a dúvida da extensão da pena de prisão: quanto tempo deverá o meliante permanecer vendo o sol nascer quadrado, eis que as normas quantificam a pena numerária, mas não quantificam a pena privativa de liberdade.

Se uma dúvida começa a se dissipar, outra se insere sorrateiramente no nosso pensamento: o que vem a ser esse desairoso jogo do Tintinini, a ensejar tantos cuidados?

Ver também:
Foral da Alfândega, cap. I.

Fonte:
PORTUGAL. Repertorio chronologico das leis, pragmaticas, alvarás,... / extrahido de muitas collecções, e diversos authores por J. P. D. R. X. D. S. Lisboa : Francisco Luiz Ameno, 1783. Disponível em http://purl.pt/6433. Acesso em 02.mar.2013.