domingo, 5 de agosto de 2018

Limites à Autoridade do Juiz Conservador

Paulo Werneck


Interior de Café Inglês -Século XXX.
Fonte: Wikimedia

Prosseguindo com o estudo dos juízes conservadores, veremos agora que, se por um lado os juízes conservadores possuíam autoridade sobre os casos envolvendo os cidadãos das nações privilegiadas, por outro lado eles não podiam fazer o que lhes desse na telha, como comprova a Lei a seguir.
Lei de 13 de Outubro de 1752.
Para que nenhum Conservador passe contramandados vagos e gerais para embaraçarem as diligências da Justiça.

DOM JOSE' por Graça de Deos Rei de Portugal, e dos Algarves, d'aquém, e d'além mar, em Africa Senhor de Guiné, e da Conquista, Navegação, Commercio da Ethiopia, Arabia, Persia, e da India ¬&c. Faço saber aos que esta Lei virem, que sendo-Me presente a grande desordem, que resulta á boa administração da Justiça de se impedirem as diligencias, que se mandão fazer pelos Ministros ordinarios, quando se dirigem contra privilegiados, com intempestivos contramandados, expedidos antes de se averiguar se no caso de cada huma das ditas diligencias tem lugar o privilegio, para em razão delle ser o privilegiado legitimamente soccorrido; e considerando quão justo, e necessario seja que nem o ministerio dos Juizes, e mais Ministros ordinarios, seja illudido, e embaraçado por semelhante modo, nem os privilegiados, que tem Juizes privativos, sejão privados do uso do seu privilegio naquelles casos, em que elles conforme a direito tem lugar: Ordeno, e mando, que da publicação desta Lei em diante nenhum Conservador passe contramandados vagos, e geraes para se deixarem de fazer com qualquer pessoa as diligencias de Justiça, sob pena de seis mezes de suspensão dos lugares, que occuparem no Meu Real serviço por cada contramandado, que expedirem na referida fórma; e na dita suspensão incorrerão ipso facto; sem mais fórma de processo, que o reconhecimento do signal, ou signaes do Ministro, ou Ministros, que assignarem os taes contramandados; porque, sendo estes apresentados aos Presidentes dos Tribunaes respectivos, ao Regedor da Casa da Supplicação, ou ao Governador da Casa do Porto; e constando-lhes por verdadeira informação, que com effeito forão assignados pelos Ministros, em cujos nomes se acharem expedidos, lhes farão logo intimar a dita suspensão, para se absterem dos seus empregos em quanto ella durar: e pelas mesmas causas annullo, e declaro por de nenhum effeito todos os contramandados, que até ao presente se tiverem expedido, na fórma, que por esta Lei se reprova. Porém as partes, que se acharem gravadas nas diligencias, que lhes fizerem de mandado das Justiças ordinarias, poderão, entendendo se lhe offendem os seus privilegios, usar do remedio da declinatoria, ou de pedir Precatorios aos seus respectivos Conservadores, que lhos poderão passar depois de verificada a legitimidade do privilegio, e a competencia delle, nos termos de cada hum dos casos, em que se requerer o Precatario. E Mando aos Presidentes dos Tribunaes respectivos, e ao Regedor da Casa da Supplicação, e Governador da Casa do Porto, e a todos os Desembargadores, Corregedores, e mais Justiças, fação inteiramente cumprir, e guardar esta Lei; e ao Doutor Francisco Luiz da Cunha de Ataide, do Meu Conselho, e Meu Chanceller Mór, a publique na Chancellaria, e envie a cópia della com o Meu Sello, e seu signal, a todos os Corregedores, Provedores, Ouvidores dos Mestrados, e Donatarios, aonde não entrar Corregedor, para a fazerem publicar por suas Comarcas E se registará nos Livros dos Meus Desembargadores do Paço, e dos da Casa da Supplicação, e Relação do Porto; e esta se lançará na Torre do Tombo. Dada em Lisboa aos 13 de Outubro de 1752. = Com a Assignatura de ElRei, e a do Marquez Mordomo Mór P.

Regist. na Chancellaria Mór da Corte, e Reino no Livro das Leis, a fol. 31, e impr. avulso.
Essa lei, por óbvio, limitou as asinhas daqueles juízes conservadores que esqueceram as suas obrigações e, por venalidade ou ignorância, passaram a tumultuar o andamento dos demais juízos.

Fontes:

SILVA, António Delgado da. Collecção da Legislação Portugueza desde a última Compilação das Ordenações. Legislação de 1750 a 1762. P. 144-145. Lisboa: Typografia Maigrense, 1830.