quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Recursos às Decisões dos Juízes Conservadores

Paulo Werneck

Pelourinho quinhentista de Mogadouro, Portugal
Fonte: www.mogadouro.pt

Os juízes conservadores poderíamos considerar como varas de primeira entrância especializadas em causas que envolvessem cidadãos estrangeiros. Como primeira entrância, e não instância única, as decisões poderiam ser agravadas ou recorridas para instâncias superiores.

O alvará a seguir dispõe sobre os agravos às sentenças do Juiz Conservador dos Ingleses.
Alvará de 31 de Março de 1790.
Ordenando que das sentenças do Conservador dos Ingleses haja Agravo Ordinário.

EU A RAINHA Faço saber aos que este Alvará com força de Lei virem: Que sendo-Me representados, por parte dos Vassallos de Sua Magestade Britanica, os prejuizos, e inconvenientes, que experimentavão nos Recursos das Sentenças proferidas pelo seu Juiz Conservador, expedindo-se por via de Appellação, ao mesmo tempo que dos Juizes Conservadores de outras Nações, e ainda de outros Magistrados menos graduados que o dito Juiz Conservador, se interpunhão por via de Aggravo Ordinario, para a Casa da Supplicação: Attendendo ao que assim Me foi representado, por fazer Graça, e Mercê aos Vassallos de Sua Magestade Britanica: Hei por bem, e Mando que das Sentenças proferidas pelos Juizes Conservadores da Nação Britanica não haja d'aqui em diante Recurso, senão por Aggravo Ordinario, e não por via de Appellação, como até agora se praticou.

Pelo que: Mando á Meza do Desembargo do Paço; Presidente do Meu Real Erario; Regedor da Casa da Supplicação; Conselho da Minha Real Fazenda, Real Junta do Commercio, Agricultura, Fabricas, e Navegação destes Reinos, e Seus Dominios; e a todos os Tribunaes, Magistrados, Officiaes de Justiça, e mais Pessoas, a quem o conhecimento deste Alvará, com força de Lei, pertencer; que o cumprão, e guardem, e fação inviolavelmente cumprir, e guardar, tão inteiramente como nelle se contém, sem dúvida, ou embargo algum; e não obstantes quaesquer Leis, Alvarás, Regimentos, Decretos, ou Ordens em contrario: Por que todos, e todas Hei por bem derogar, para este effeito sómente, como se de tudo fizesse individual, e expressa menção; ficando aliàs sempre em seu vigor. E ao Doutor José Ricalde Pereira de Castro, do Meu Conselho, Meu Desembargador, do Paço, e Chanceller Mór destes Reinos, Ordeno que o faça publicar na Chancellaria, passar por ella, e registar nos Livros della, a que tocar; remettendo os Exemplares delle impressos debaixo do Meu Sello, e seu signal, a todos os Lugares, e Estações, a que se costumão remetter semelhantes Alvarás; e guardando-se o Original no Real Archivo da Torre do Tombo. Dado no Palacio de Nossa Senhora da Ajuda em 31 de Março 1790. = Com a Assignatura da Rainha, e a do Ministro.

Regist. na Secretaria de Estado dos Negocios do Reino no Liv. VIII. das Cartas, Alvarás, e Patentes a. fol 10, e impr. na Impressão de Antonio Rodrigues Galhardo.
Esse alvará, portanto, ao definir quais os remédios possíveis, prova que as decisões dos juízes conservadores não eram necessariamente finais, mas poderiam ser reformadas por tribunal superior.
Alvará de 27 de Novembro de 1797.
Determinando para quem se apele, ou recorra do Conservador e Juiz Ordinário de Malta, e do Arcebispo Vigário Geral do Crato.

EU A RAINA. Faço saber aos que este Alvará com força de Lei virem: Que sendo-me presentes as dúvidas, que se excitavão na Meza dos Juizes da Corôa, e dos Aggravos da Casa da Supplicação, a respeito do Conservador, e Juiz Ordinario da Religião de Malta, ser Juiz Privativo dos Alistados na Companhia chamada da Corte, creada, e concedida pelo Senhor Rei Dom Pedro Segundo, Meu Avô, a Dignidade Prioral do Crato: Declarando-se pelo Decreto de dezenove de Abril de mil setecentos e oitenta, que o dito Ministro era Privativo para conhecer na Primeira Instancia de todas as Causas, em que os Officiaes, e Soldados da sobredita Companhia fossem Authores, ou Réos: Sou agora informada, que se tem movido questões, para onde se deve Aggravar, ou Appellar dos Despachos, e Sentenças do sobredito Conservador, por ser a Jurisdicção, que exercita nas Causas dos referidos Privilegiados, inteiramente Civil, e Temporal, assim pela sua origem, como pelo seu objecto; E que outro sim se entra tambem na dúvida, para onde se ha de interpôr o competente Recurso dos Despachos, e Sentencas proferidas pelo Arcebispo Provisor, e Vigario Geral do Grão Priorado do Crato, por se achar aquelle Priorado, em quanto ao Temporal, unido perpetuamente á Casa, e Estado do Infantado, por Bulla do Santo Padre Pio Sexto, inserta na Minha Carta de Robora de trinta e hum de Janeiro de mil setecentos e noventa, ficando pelo que pertence ao Espiritual sujeito immediatamente á Santa Sé Apostolica, sem dependencia alguma da Ordem de Malta, na fórma da outra Bulla do mesmo Santo Padre de oito de Janeiro de mil setecentos noventa e tres, que começa: Quoniam Ecclesiasticum, impetrada tambem á Minha Instancia; E querendo pôr termo a similhantes dúvidas, que de preterito tem sido preteridas, precipitando-se Decisões estranhas, e absurdas, e podem de futuro produzir outras maiores: Sou servida Declarar, e Mandar aos ditos respeitos o seguinte, em quanto não estabeleço outras Providencias.

Que os Aggravos, e Appellações, que se interpozerem dos Despachos, e Sentenças do sobredito Conservador, e Juiz Ordinario da Religião de Malta nas Causas, em que os referidos Privilegiados forem Authores, ou Réos, vão para a Relação do Districto.

Que das Primeiras Instancias das Terras do Grão Priorado do Crato, no Foro Secular, se oberve, e pratique o mesmo que Tenho determinado a respeito das Terras das Ordens Militares, e Casa do Infantado nos Paragrafos XX., e XXII. da Lei de dezenove de Julho de mil setecentos e noventa.

Que no Foro Ecclesiastico do mesmo Grão Priorado do Crato, dos Depachos, e Sentenças do Arcebispo Provisor, e Vigario Geral, se Recorra á Corôa, e Appelle para a Legacia, e Nunciatura Apostolica, como antigamente se praticava.

Pelo que: Mando á Meza do Desembargo do Paço; Presidente do Meu Real Erario; Regedor da Casa da Supplicação; Conselhos da Minha Real Fazenda, e do Ultramar; Meza da Consciencia e Ordens, e aos mais Tribunaes; Governador da Relação, e Casa do Porto, ou quem seu Lugar servir; e a todos os Magistrados, e mais Pessoas, a quem o conhecimento deste Alvará com força de Lei pertencer, que o cumprão, e guardem, e fação cumprir, e guardar tão inteiramente como nelle se contém, sem dúvida, ou embargo algum; e não obstantes quaesquer Leis, Alvarás, Regimentos, Decretos, ou Ordens em contrario; porque todos, e todas Hei por bem Derogar para este effeito sómente. E ao Doutor José Alberto Leitão, do Meu Conselho, Desembargador do Paço, e Chanceller Mór destes Reinos, Ordeno, que o faça publicar na Chancellaria, e registar nos Livros della a que tocar, remettendo os Exemplares delle impressos debaixo do Meu Sello, e seu Signal, a todos os Lugares, e Estações, a que se costumão remetter similhantes Alvarás; e guardando se o Original no Meu Real Archivo da Torre do Tombo. Dado no Palacio de Quéluz em 21 de Novembro de 1797. = Com a Assignatura do Principe com Guarda.

Regist. na Secretaria de Estado dos Negocios do Reino no Liv. 9.° das Cartas, Alvarás, e Patentes, a fol. 47, e impresso na Officina de Antonio Rodrigues Galhardo.
Este alvará relaciona que órgãos devem funcionar como segunda instância a outros juízes conservadores, não de nacionais de outras nações, mas de militares e religiosos, o que vem a ratificar o conceito de que os juízes conservadores funcionavam como varas especializadas.

Fontes:

SILVA, António Delgado da. Collecção da Legislação Portugueza desde a última Compilação das Ordenações. Legislação de 1775 a 1790. p. 590. Lisboa: Typografia Maigrense, 1828.

SILVA, António Delgado da. Collecção da Legislação Portugueza desde a última Compilação das Ordenações. Legislação de 1791 a 1801. p. 466-467. Lisboa: Typografia Maigrense, 1828.