segunda-feira, 24 de março de 2008

Redução de Gravames Aduaneiros - 1808

Paulo Werneck
Decreto de 11 de junho de 1808, do Príncipe Regente D. João, que reduz os gravames aduaneiros.





DECRETO.
SENDO conveniente ao bem Publico remover todos os embaraços, que possão tolher o livre giro, e a circulação do Commercio : E Tendo consideração ao estado de abatimento, em que de presente se acha o Nacional, interrompido pelos conhecidos estorvos, e actuaes circunstancias da Europa : Desejando animallo, e promovello em beneficio da Causa Publica pelos proveitos, que lhe resultão de se augmentarem os cabedaes da Nação por meio de maior numero de Trocas, e Transacções Mercantis, e de se enriquecerem os Meus fieis Vassallos, que se dão a este ramo de prosperidade publica, e que muito Pertendo favorecer como huma das Classes uteis do Estado : E Querendo outrosim augmentar a Navegação, para que prospere a Marinha Mercantil, e com ella a de Guerra, necessaria para a defeza dos Meus Estados, e Dominios : Sou Servido ordenar, que todas as Fazendas, e Mercadorias, que forem proprias dos Meus Vassallos, e por sua conta carregadas em Embarcações Nacionaes, e entrarem nas Alfandegas do Brazil, paguem de Direito por entrada dezaseis por cento sómente; e os generos, que se denominão Molhados, paguem menos a terça parte, do que se acha estabelecido, derogada nesta parte a disposição da Carta Regia de vinte e oito passado, ficando em seu vigor em tudo o mais : E que todas as Mercadorias, que os meus Vassallos assim importarem, para as reexportar para os Reinos, e Dominios Estrangeiros, declarando-o por esta maneira nas Alfandegas, paguem quatro por cento sómente de baldeação, passando-as depois para Embarcações Nacionaes, ou Estrangeiras, que se destinarem a Portos Estrangeiros; o que com tudo só terá lugar nas Alfandegas desta Corte, Bahia, Pernambuco, Maranhão, e Para; e nellas haverá a maior fiscalização. E acontecendo fazer-se alguma tomadia de fazendas desviadas daquelle destino, serão apprehendidas, e julgadas com outro tanto do seu valor a bem do Denunciante, e dos que as apprehenderem, na fórma do Alvara de cinco de Janeiro de mil setecentos oitenta e cinco. O Presidente do Meu Real Erario o tenha assim entendido, e mande expedir as ordens necessarias. Palacio do Rio de Janeiro em onze de Junho de mil oitocentos e oito.
Com a Rubrica do PRINCIPE REGENTE N. S.
Regist.
Na Impressão Regia.

Comentários

Esse decreto criou uma preferência tarifária na importação que favoreceu os vassalos do Reino de Portugal, indiferentemente de serem natos da ou residirem na Metrópole, na América Portuguesa ou nas demais colônias de África ou Ásia.
O benefício tarifário, para ser aplicado, exigia que tanto o importador, consignatário da mercadoria, fosse vassalo português, como que a embarcação transportadora fosse de bandeira portuguesa: falhando uma das condições, ambas necessárias, ficava a prevalecer a tarifa cheia, estabelecida pela Carta Régia de 12 de abril daquele ano, a da "Abertura dos Portos".

Alcance Geográfico do Decreto

A redução tarifária só beneficiou as mercadorias importadas e desembaraçadas pelas alfândegas portuguesas localizadas no Brasil, excluídas portanto tanto as alfândegas metropolitanas como aquelas localizadas nas demais colônias, cujas tarifas permaneceram inalteradas.

Tipos de Mercadorias

Os ditos gêneros, mercadorias e fazendas dividiam-se em secos e molhados.
Molhados compreendiam vinhos, azeites, aguardentes e, segundo Almeida (2005), também outros alimentos transportados em tonéis. Secos, por exclusão, englobava tudo o mais.

Tarifas

As tarifas cheias, definidas pela citada carta régia, importavam em 24% para os secos e no dobro das anteriormente aplicadas para os molhados, o que, segundo Almeida, significava 48%.
Para os beneficiados as novas tarifas teriam sido, portanto, de 16% para os secos e de 36% para os molhados, considerando-se a redução de um terço para essa última.

Reexportação

O decreto também regulou a reexportação, por vassalos portugueses, de bens de qualquer origem transportados por embarcações de qualquer bandeira: 4% de taxa de baldeação.
A operação ficou restrita às alfândegas do Rio de Janeiro (sede da Corte), Bahia, Pernambuco, Maranhão e Pará, aquelas em que o Príncipe Regente reputava haver fiscalização mais firme.
Entretanto, antevendo as possíveis, talvez prováveis burlas, foi estabelecida a pena de perdimento, não a favor do Real Erário, mas devendo a mercadoria desviada e apreendida ser dividida metade para o informante e metade para os oficiais da Aduana, que com tudo ficariam, caso agissem de moto próprio, sem informações passadas por terceiros.

Referências

ALMEIDA, Paulo Roberto de. Formação da Diplomacia Econômica do Brasil, 2 e. São Paulo: Senac; Brasília: Funag, 2005.
PORTUGAL. Alvará de cinco de janeiro de 1785. Alvará prohibindo as Fábricas, e Manufacturas, no Brazil. In: SILVA, Antonio Delgado da [redator]. Collecção da Legislação Portugueza Desde a Ultima compilação das ordenações, legislação de 1775 a 1790. Lisboa: Typografia Maigrense, 1828. Disponível em http://www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt/verlivro.php?id_parte=109&id_obra=73&pagina=565. Acesso em: 22 fev. 2008.
_____. Carta Régia de 28 de janeiro de 1808. Carta Regia ao Conde da Ponte: Abrindo os Portos do Brazil ao Commercio directo Estrangeiro sem excepção de Fazendas ... In: PORTUGAL. na Collecção das leis, alvarás, decretos, cartas régias, &c. promulgadas no Brasil desde a feliz chegada do príncipe regente N. S. a estes estados com hum índice chronologico. Tomo I. Rio de Janeiro: Impressão Régia, [1811-1822]. Disponível em www.brown.edu/Facilities/John_Carter_Brown_Library/CB/1808_docs/L01_p01.html. Acesso em: 15 fev. 2008.
_____. Decreto de 11 de junho de 1808. Decreto ordenando os Direitos de entrada nas Alfandegas do Brazil. In: PORTUGAL. na Collecção das leis, alvarás, decretos, cartas régias, &c. promulgadas no Brasil desde a feliz chegada do príncipe regente N. S. a estes estados com hum índice chronologico. Tomo I. Rio de Janeiro: Impressão Régia, [1811-1822]. Disponível em www.brown.edu/Facilities/John_Carter_Brown_Library/CB/1808_docs/L35_p01.html. Acesso em: 08 mar. 2008.